Sugestão de leitura: Arquivos do abandono: experiências de crianças e adolescentes internados em instituições do Serviço Social de Menores de São Paulo (1938-1960). São Paulo: Cortez, 2004.

Livro oriundo de pesquisa de mestrado defendido em 2002 com orientação de Heloisa de Faria Cruz, teve objetivo discutir as experiências de crianças e adolescentes abandonados que viveram no Serviço Social de Menores de São Paulo entre os anos de 1938 e 1960, sendo que tais experiências foram recuperadas a partir de análise dos prontuários dessas crianças e adolescentes. O método utilizado pela autora é lançar mão de trechos de análises e julgamento contidos nesses prontuários para problematizar sua linha argumentativa. Bernal desenvolve um trabalho para centralizar as experiências desses a partir de diversas problemáticas que permeiam a obra, como família, condições sociais, formas de resistência, etc., o que faz transparecer o discurso assistencialista e repressor em cada prontuário. Além disso, o que faz o livro ser uma útil referência de pesquisa é o fato da autora questionar a todo momento como, por quem e por que tais  crianças e adolescentes foram institucionalizados. 

A autora não desconsidera a perspectiva macro em seu trabalho, desenvolvendo primeiramente uma análise histórica das políticas e instituições totais voltadas para o “cuidado” de crianças e adolescentes em situação do que hoje se nomeia como “vulnerabilidade social”. Nesse sentido, a autora problematiza as políticas públicas da época abordada, assim como seu nascimento e o contexto que permite a sua cada vez maior robustez. Também percebe-se o esforço de Bernal em ver as crianças e adolescentes retratados nos prontuários como indivíduos donos de sua própria história, “desvinculando essa pesquisa de uma história da criança que se fez à sombra daquela dos adultos” (BERNAL, pag. 23, 2004). Ou seja, constata-se em cada fuga, cada atuação, cada silêncio, cada forma particular de submissão, como uma forma de resistência. 

Também é possível apreender na leitura deste texto alguns problemas que, apesar de tanto tempo decorrido, mostram-se extremamente atuais e relevantes para a compreensão da atual situação das instituições responsáveis pela “ressocialização” destes adolescentes, como as dificuldades encontradas pelos jovens no momento de desinternação, como problemas de moradia, adaptação, reintegração com a família e limitação de preparo profissional e educacional. 

Entidades de defesa da criança e do adolescente podem ganhar direito de ingressar com ação civil pública

Entidades dedicadas à proteção dos direitos de crianças e adolescentes podem entrar na lista de entes públicos e associações com direito a propor ações civis públicas na Justiça. Esse instrumento legal, destinado à defesa de interesses  difusos,  coletivos  e  individuais  homogêneos, atualmente pode ser proposto por Ministério Público, Defensoria Pública, União, estados e municípios. A Lei da Ação Civil (7.347/1985) prevê ainda a iniciativa da ação por associações de proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre  concorrência, ao  patrimônio  artístico,  estético,  histórico,  turístico  e paisagístico. Mas não por entidade de defesa dos direitos de crianças e adolescentes.

Para mudar a situação, está em análise na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), o Projeto de Lei do Senado (PLS) 753/2011, do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que inclui associações dedicadas à defesa dos direitos de crianças e adolescentes no rol de agentes legitimados para propor ação civil pública. A proposta está sob relatoria do senador Magno Malta (PR-ES).

Ao justificar o projeto, Aécio Neves explicou que, ao longo dos anos, com as transformações sociais, econômicas e jurídicas ocorridas no país, novos modelos de entidades foram conquistando o direito a ingressar com ações civis públicas. E, depois de mais de décadas da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a sociedade, o meio jurídico e o meio acadêmico já teriam atingido “maturidade suficiente” para ampliar mais uma vez o rol de legitimados.

– Trata-se,  ainda,  de importante  mecanismo  para  estimular  o  civismo  e  a  participação  popular  nas questões  de  interesse  público,  revigorando  nosso  regime  democrático,  cuja maturidade se revela não somente ao assegurar direitos como também ao atribuir responsabilidades – argumentou o senador.

A CDH aguarda apresentação do relatório de Magno Malta para votação da matéria. Se aprovada, o projeto segue para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde tramitará em caráter terminativo.

Para acessar o projeto de lei, clique aqui.

Especial FEBEM da Revista Carta Maior

A mídia pode ser muito útil em diversos tipos de pesquisas acadêmicas, afinal, através dela pode-se visualizar diversos processos que influenciam temas, relações, formas, etc. Obviamente não mostra-se muito útil acreditar cegamente nas coisas escritas e ouvidas diariamente, mas problematizar algumas questões colocadas pela mídia pode ser de grande auxílio para compreender questões da realidade social. 

Esse é um dos motivos que eu estou indicando este link. O outro motivo é que o jornalismo da Revista Carta Maior demonstra maior qualidade do que a média dentre os veículos de comunicação, dados que estes se pautam pelo denuncismo, imediatismo e pelo mercado. 

Ao acessar o site da Carta Maior (Clique aqui) eis que encontro uma espécie de dossiê FEBEM – SP, com diversas notícias entre 2003 e 2006, que abordam os últimos suspiros desta instituição que estava prestes a ser substituída pela Fundação Casa. Acho que estas notícias nos dão uma perspectiva sobre como foi essa transição institucional, o que pode ser imensamente útil para qualquer interessado no assunto. 

Enfim, é uma página que vale a pena ser vasculhada.